terça-feira, 23 de agosto de 2011

Benefícios Fiscais de ICMS: uma saída jurídica para o problema decorrente da Declaração de Inconstitucionalidade pelo Supremo.

Marciano Buffon *


Em uma histórica decisão, o Supremo Tribunal Federal (STF) – no início de junho – entendeu inconstitucionais 23 normas criadas pelos Estados para favorecer empresas e atrair investimentos, as quais causavam prejuízos na arrecadação das demais Unidade da Federação. Foram julgadas 14 ações de inconstitucionalidade, contra benefícios fiscais concedidos unilateralmente pelo Rio de Janeiro, Paraná, Pará, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Espírito Santo e Distrito Federal.

Vale ressaltar o posicionamento do Presidente da Corte Constitucional, Ministro Cezar Peluso, segundo o qual “não serão toleradas medidas inconstitucionais tomadas por um governo para obter vantagem financeira em detrimento de outro Estado”. Conforme a decisão, os incentivos fiscais que dizem respeito ao ICMS só podem ser concedidos, mediante convênios firmados no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), constituído por todos os Secretários de Fazenda. Uma vez que, na maioria dos casos, este requisito vinha sendo descumprindo, pode-se afirmar que praticamente todos Estados concederam benefícios fiscais de ICMS, sem a observância da lei e da própria constituição, não obstante tais benefícios, por vezes, tenham se travestidos de meros incentivos de ordem financeira.


Mais recentemente, a denominada “guerra fiscal” de ICMS acirrou-se de uma forma particularmente perversa, haja vista que várias Unidades da Federação passaram a conceder benefícios fiscais na importação de mercadorias. Não raras vezes, o desembaraço dá-se de uma forma fictícia no Estado que concede o tratamento privilegiado, sendo quea as mercadorias ato contínuo são transferidas para o efetivo destino, implicando destaque nas notas fiscais de impostos que efetivamente não foram recolhidos e créditos fiscais no Estado destinatário. Aliás, esta sistemática afeta fortemente a própria indústria nacional, assolada, de um lado, pela apreciação do câmbio e, de outro, por uma verdadeira concorrência desleal de produtos importados, via concessão de privilégios ilegais a tais produtos.

A partir disso, há uma série de questões que se colocam. A primeira diz respeito aos efeitos decorrentes da decisão do Supremo Tribunal Federal. Sabe-se, pois, que uma decisão que declara inconstitucional uma norma jurídica – em regra – retroage à data da publicação, ou seja, neste caso os benefícios fiscais que foram usufruídos deveriam ser restituídos ao Estado que os concedeu. No entanto, isso é praticamente impossível de acontecer, haja vista que implicaria a assunção de um ônus insuportável às empresas.


Alternativamente, o Supremo poderia modular os efeitos das decisões, isto é, estabelecer que a declaração de inconstitucionalidade produza efeitos a partir do momento da publicação da decisão judicial. O problema disso, é que os Estados indiretamente sentir-se-iam autorizados a conceder novos incentivos unilaterais, pois até o momento em que fossem declarados inconstitucionais, produziriam os efeitos desejados e nada mudaria na denominada guerra fiscal.


No entanto, estas incertezas todas podem ser vistas com certo grau de otimismo, uma vez que elas forçam a realização de uma reforma tributária, mesmo que parcial, no sentido de serem estabelecidas regras que vinculam todas as Unidades da Federação. A principal delas, diz respeito à unificação das alíquotas interestaduais de ICMS em percentuais reduzidos (no máximo 4%, embora o ideal fosse 0%), numa tentativa de fazer com que o produto da arrecadação pertença (embora ainda parcialmente) ao Estado no qual a mercadoria vier a ser consumida (tributação “no destino”).


Por outro lado, no bojo desta “reforma tributária” poderia ser incluído um dispositivo que evitasse a insegurança jurídica decorrente da declaração de inconstitucionalidade, no sentido de definir que os benefícios fiscais usufruídos até o momento restariam homologados, sendo terminantemente proibida a concessão de novos, sejam de quais espécies forem. Esta, pois, é a única saída que se pode vislumbrar para solução deste grande imbróglio jurídico e econômico, que hoje correspondente inequivocamente a uma das principais questões tributárias do país.


* Advogado Tributarista, Doutor em Direito. Professor do PPGD da UNISINOS e membro do Conselho Consultivo do Instituto Justiça Fiscal.

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