sábado, 25 de junho de 2011

Decadência do direito de lançar

Por  Ricardo Bertolini,
 
Conceito de Crédito Tributário
A obrigação tributária surge, no exato momento em que ocorre no mundo fático, o fato gerador. O direito tributário, por ser de um ramo muito rígido do direito público, o CTN estabeleceu como regra geral, à necessidade de ocorrer ainda, um momento complementar em que se faz imprescindível a atuação da administração tributária com o fim de tornar exigível aquela obrigação surgida com a ocorrência do fato gerador. Segundo essa lógica vigente em nosso sistema, à obrigação tributária, que surge automaticamente com a ocorrência do fato gerador, falta certeza e liquidez, não sendo, portanto, exigível. Para atestar sua existência e liquidez da obrigação tributária, determinando seu exato valor, é necessária a atuação do fisco. Essa atuação do fisco se traduz no ato ou procedimento administrativo denominado lançamento.
A obrigação tributária tornada líquida e certa pelo ato administrativo do lançamento passa a ser chamada crédito tributário.
Crédito tributário, portanto, é a própria obrigação tributária em um segundo momento. É a obrigação tributária tornada líquida e certa, portanto exigível, como decorrência do lançamento. É isso que o CTN quer dizer quando afirma, em seu artigo 139 que “O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta”.
Conceito de Lançamento
O CTN, no seu artigo 142, conceitua lançamento e descreve as principais funções desempenhadas por esse procedimento administrativo. Diz o artigo 142 do CTN:
“Artigo 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.”
 
Trata-se do ato ou procedimento administrativo, privativo da autoridade administrativa, que constitui o crédito tributário. O lançamento tem natureza constitutiva do crédito e declaratória da obrigação. Declaratória da obrigação, porque esta existe antes do lançamento e independe dele.
É o lançamento o ato que dá certeza e liquidez à obrigação tributária, tornando-a exigível, momento a partir do qual passa a existir o crédito tributário. Na lição de Luciano Amaro[1], a prática do lançamento é necessária para que o sujeito ativo possa exercitar atos de cobrança do tributo, primeiro administrativamente e depois mediante ação judicial, através de execução fiscal, precedida esta de outra providência formal, que é a inscrição do crédito em dívida ativa.
Nesse sentido, o lançamento seria sempre necessário, ainda que se opere por omissão da autoridade administrativa competente. O que se depara atualmente é a evolução das legislações que claramente dispensa os lançamentos em certas situações, criando obrigações dos contribuintes em pagar os tributos independentemente da provocação do fisco, de modo a proceder ao lançamento somente nos casos de omissões. Alberto Xavier[2] conceitua lançamento como “o ato administrativo de aplicação da norma tributária material”, que se traduz na declaração da existência e quantitativo da prestação tributária e na sua conseqüente exigência. As diversas operações arroladas no dispositivo não passam, no dizer de Alberto Xavier, de “momentos lógicos do processo subsuntivo”[3], em que se traduz a aplicação da norma tributária material. Tece crítica severa quanto ao conceito de lançamento, iniciando por dizer que constitui o crédito tributário, o que poderia representar uma opção pela tese da natureza constitutiva daquele ato administrativo, não fosse isso desmentido por várias outras disposições do mesmo código. Em sua opinião, o lançamento deve ser definido pelo que é e não pelo que dele decorre, afastando-se o conceito de “constituição do crédito” ou “formalização do crédito”. Finaliza, criticando a parte final do artigo 142 do CTN, quanto à proposição da aplicação da penalidade cabível, argumentando que dessa forma o lançamento mais parecia com um inquérito fiscal, tendente à aplicação de multa, se o agente assim entender. Ora, a autoridade administrativa somente poderia propor a penalidade cabível, sendo óbvio que as incabíveis não poderiam ser propostas. Não necessariamente o lançamento não terminaria com a proposta de penalidade, já que ele seria apenas uma tendência.
Acontece que a autoridade administrativa ao se deparar com a situação fática de cometimento de certa infração, lavrava o denominado auto de Infração, descrevendo os fatos e indicando as penalidades previstas, dando ciência ao sujeito passivo para que este apresentasse sua defesa. Após a apresentação dos argumentos de defesa, decidia-se sobre a efetiva aplicação da pena. Atualmente, ao se deparar com a infração, o fisco exige o tributo devido e aplica a penalidade legal prevista.
Mas, segundo a definição legal do CTN, o código enumera como funções do lançamento: identificar o sujeito passivo, verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação, determinar a matéria tributável, ou seja, apurar a base de cálculo, calcular o montante do tributo devido, ou seja, tornar líquida a obrigação preexistente e aplicar a penalidade, se for o caso.
Em razão do princípio da indisponibilidade do interesse público, o lançamento é ato vinculado, não se admitindo considerações de oportunidade e conveniência. Deverá constar do lançamento o prazo para pagamento ou impugnação, esta no caso de o sujeito passivo não concordar com o crédito exigido e pretender discuti-lo na esfera administrativa. A lei aplicável ao lançamento é a lei que estava vigente na data da ocorrência do fato gerador, artigo 144, do CTN. Portanto, se ocorreu o fato gerador do ICMS em janeiro, quando a alíquota era 17%, e em fevereiro foi publicada lei estadual reduzindo a alíquota para 12%, e em março é efetuado um lançamento relativo àquela operação, a alíquota de ICMS utilizada no lançamento para cálculo do tributo será de 17%.
O fato de ser a lei aplicável ao lançamento aquela em vigor na data do fato gerador, mesmo que já revogada na data do lançamento, é denominado princípio da ultratividade da lei tributária. Dizer que uma lei é ultrativa significa exatamente isso: ela é lei que rege os fatos geradores ocorridos durante sua vigência e será ela a lei aplicada, mesmo que, no momento de sua aplicação, não mais esteja mais vigendo.
O § 1º do artigo 144 do CTN estabelece uma exceção à regra de ultratividade da lei tributária. Há hipóteses em que será aplicada ao lançamento uma lei que não estava ainda vigente na data da ocorrência do fato gerador. Nesses casos, a lei retroagirá para alcançar fatos geradores ocorridos antes do início de sua vigência. É a seguinte a sua redação:
 
“§ 1º Aplica-se ao lançamento a legislação que, posteriormente à ocorrência do fato gerador da obrigação, tenha instituído novos critérios de apuração ou processos de fiscalização, ampliado os poderes de investigação das autoridades administrativas, ou outorgado ao crédito maiores garantias ou privilégios, exceto, neste último caso, para o efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros.”
 
Esse dispositivo traz para o âmbito do Direito Tributário a regra geral segundo a qual as leis processuais têm aplicação imediata. Um exemplo de aplicação dessa exceção do § 1º do artigo 144 foi o caso da CPMF. A lei que a criou, em seu texto original, proibia a utilização dos dados a ela relativos para o cruzamento de informações e lançamento de outros tributos. Em 2001 foi feita uma alteração nessa lei, de forma que passou a constar dela disposição exatamente contrária, autorizando o uso de dados relativos à CPMF para lançamento de outros tributos. Tal alteração ampliou os poderes de investigação do fisco. A fazenda fez lançamentos de tributos cujos fatos geradores ocorreram antes de 2001, com base nos dados de movimentação financeira, obtidos a partir da CPMF, e o Poder Judiciário tem entendido legítimo esse procedimento, com base no artigo 144, § 1º, do CTN. O mesmo vale para a legislação que tenha concedido maiores garantias ou privilégios ao crédito, exceto, nesse caso, para o efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros, vez que a lei que atribua responsabilidade é lei tributária material e não procedimental.
A doutrina, com base nas disposições do CTN, classifica o lançamento nas seguintes modalidades, em ordem crescente de participação do sujeito passivo: lançamento de ofício ou direto, lançamento por declaração ou misto e lançamento por homologação ou auto-lançamento.
As hipóteses em que o lançamento de ofício deve ser efetuado ou revisto são aquelas previstas no artigo 149 do CTN. A revisão pressupõe existência de um lançamento anterior, sob qualquer modalidade, e deve ser realizada dentro do prazo de decadência do direito de constituir o crédito. A revisão é feita por meio de um lançamento de ofício, que pode ser um lançamento complementar ou um novo lançamento, no caso de nulidade do anterior. O auto de infração é uma das espécies de lançamento de ofício. É a espécie utilizada sempre que for necessário aplicar a denominada multa de ofício. O IPVA, IPTU, as contribuições de melhoria e a maioria das taxas são lançadas originariamente por meio de lançamentos de ofício.
Importante destacar o artigo 149 do CTN:
 
“Artigo 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:
I - quando a lei assim o determine;
II - quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;
III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;
IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;
V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;
VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária; VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;
VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior;
IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial.
Parágrafo único. “A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.”
 
 
 
lançamento por declaração é tratado no artigo 147 do CTN:
 
“Artigo 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.
§ 1º A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento.
§ 2º Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela.”
 
A principal característica do lançamento por declaração, que o distingue do lançamento por homologação, é o fato de não ser possível haver pagamento pelo sujeito passivo antes de a fazenda calcular o tributo e notificá-lo para pagar. A declaração é uma obrigação acessória em que o sujeito passivo presta informações relativas a matéria de fato. O lançamento propriamente dito é efetivado pela autoridade administrativa, que calcula o montante do crédito tributário e notifica o sujeito passivo para que ele pague o montante exigido ou exerça seu direito de defesa e impugne o lançamento. Portanto, o lançamento não estará concluído enquanto não ocorrer a notificação ao sujeito passivo, feita pela autoridade administrativa. Por esse motivo, a retificação da declaração, prevista no § 1º do artigo 147, é possível somente antes de o contribuinte ser notificado através do lançamento de ofício. Depois de notificado o lançamento, não é cabível cogitar de retificação para reduzir ou excluir tributo, porque a retificação da declaração não é hipótese de alteração do lançamento, e as únicas hipóteses admitidas de modificação do lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo são as enumeradas no artigo 145 do CTN.
Não significa isso, entretanto, que o sujeito passivo que tenha cometido um erro e não o tenha corrigido antes da notificação fique obrigado a pagar tributo não devido. O que ocorre é que o meio adequado à alteração do lançamento será a sua impugnação, com a comprovação do erro que lhe deu origem, e conseqüente instauração do Processo Administrativo Fiscal, ao término do qual será declarada indevida a parcela do crédito calculada em função do erro constante da declaração.
É interessante que, no caso de o sujeito passivo pretender retificar a declaração visando a aumentar o tributo exigido, poderá fazê-lo após a notificação.  Nessa hipótese, a autoridade administrativa efetuará um lançamento complementar de ofício, com base no artigo 149, especialmente o disposto no seu inciso VIII.
Ainda relativamente à retificação da declaração, o § 2º do artigo 147 prevê a possibilidade de ela ser efetuada de ofício pela autoridade administrativa quando verificados erros materiais na declaração. Essa retificação será sempre feita antes de efetivado e notificado o lançamento.
A última e mais complexa modalidade de lançamento prevista no CTN é o lançamento por homologação. Como o CTN considera o lançamento ato privativo da autoridade administrativa, criou a ficção de que mesmo quando o cálculo e o pagamento do tributo são inteiramente efetuados pelo sujeito passivo somente se opera o lançamento com o ato expresso ou tácito por meio do qual a autoridade administrativa homologa o pagamento realizado pelo sujeito passivo.
O lançamento por homologação está assim disciplinado no CTN:
 
“Artigo 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento.
§ 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito.
§ 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação.
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.”
 
O § 1º do artigo 150 não é fácil de interpretar, porque ele contém uma inversão lógica. Afirma ele que o pagamento antecipado extingue o crédito sob condição resolutória da homologação futura. Entendeu o CTN que a extinção não poderia dar-se sob condição suspensiva, pois, se assim fosse, o sujeito passivo estaria em mora quando ocorresse a homologação, uma vez que a produção dos efeitos da extinção somente ocorreria quando se implementasse a condição pela homologação. Para evitar esse problema, o Código enunciou que a extinção pelo pagamento antecipado estaria submetida a uma condição resolutória, o que permite que se produzam os efeitos da extinção desde o pagamento. Entretanto, o implemento de uma condição resolutória desfaz o ato jurídico condicionado. Portanto, pela literalidade do parágrafo, a homologação acarretaria o desfazimento da extinção do crédito, provocando a cessação dos efeitos dessa extinção. Essa interpretação literal não pode ser adotada, porque leva a um evidente absurdo. Portanto, é imprescindível que se faça uma interpretação corretiva do § 1º do artigo 150 do CTN, para chegar à conclusão de que a resolução, ou seja, o desfazimento, da extinção do crédito ocorre pela não-homologação do pagamento. Logo, o dispositivo deve ser lido assim: o pagamento antecipado extingue o crédito, estando sujeita a extinção a condição resolutória, cujo implemento ocorre com a  não-homologação do pagamento. Menor esforço também não é exigido para interpretação dos §§ 2º e 3º, do artigo 150. Como o crédito somente se constitui pelo lançamento, e a extinção do crédito extingue a obrigação correspondente, o CTN entendeu por bem explicitar que a obrigação tributária não sofre nenhuma alteração enquanto não ocorrida a homologação.
O pagamento antecipado, portanto, enquanto não homologado, não extingue a obrigação tributária. Isso porque, se a obrigação estivesse extinta, não mais existiria o direito de a fazenda efetuar um eventual lançamento de ofício na hipótese de não-homologação do pagamento. Entretanto, para deixar claro que, no caso de o pagamento antecipado ser menor do que o devido, somente será efetuado um lançamento de ofício da diferença, o § 3º afirma que valor já pago será levado em consideração, e o lançamento somente abrangerá o saldo restante de tributo, bem como as penalidades cabíveis, proporcionalmente a esse saldo.
E finalmente, o § 4º trata da homologação tácita. Embora o CTN tenha estabelecido como regra que o lançamento por homologação ocorrerá com o ato mediante o qual a autoridade administrativa, verificando que o pagamento efetuado pelo sujeito passivo está correto, expressamente o homologa, o próprio Código previu a possibilidade, nem um pouco rara, de a fazenda não se manifestar em um prazo razoável ao pagamento efetuado antecipadamente pelo sujeito passivo. Como ele, evidentemente, não poderia permanecer indefinidamente à mercê da potencial manifestação fisco, o § 4º do artigo 150 estabelece que, salvo prazo diverso previsto em lei, considera-se feita a homologação e definitivamente extinto o crédito em cinco anos, contados do fato gerador. Essa extinção do crédito pela inércia da fazenda é denominada homologação tácita e sua principal conseqüência é impossibilitar à fazenda lançar de ofício quaisquer diferenças relativas ao pagamento feito pelo sujeito passivo. Vemos, portanto, que, no caso do lançamento por homologação, não ocorre exatamente decadência do direito de realizar essa modalidade de lançamento. O que se verifica é a extinção definitiva do crédito pelo instituto da homologação tácita. Essa determina a extinção do direito lançar de ofício eventuais diferenças relativas ao pagamento antecipado efetuado pelo sujeito passivo. Em síntese, a homologação tácita opera a decadência do direito de realizar-se o lançamento de ofício relativo à diferença do tributo que deixou de ser pago e os acréscimos legais a essa diferença.
Importante notar a parte final do § 4º do artigo 150, que ressalva os casos de dolo, fraude ou simulação. Ocorre que o dispositivo faz a ressalva e não estabelece a disciplina a ser seguida diante desses casos. Nesses casos, a posição majoritária da doutrina entende que se aplicam as regras contidas no artigo 173, inciso I, do CTN.
Conceito de Decadência
O CTN, em seu artigo 156 enumera doze formas de extinguir o crédito tributário. O inciso V inclui a decadência como forma de extinção do crédito tributário. Segundo Luciano Amaro[4], a decadência e a prescrição têm em comum a circunstância de ambas operarem à vista da conjugação de dois fatores: o decurso de certo lapso de tempo e a inércia do titular de um direito. Esses fatores resultarão, para o sujeito que permaneceu inerte, ou na extinção de seu direito material ou na perda do direito de ação que possuiria para ver assegurado o exercício de seu direito. Rolim[5] conceitua o instituto da seguinte forma:
 
“A decadência é um instituto de direito material que traz em seu bojo a ação deletéria do tempo em relação a direito potestativo por conta da incúria de seu titular, ultimando a plena realização do princípio da segurança do direito, ditado pela manutenção da estabilidade das relações jurídicas, e em prol do interesse pela preservação da harmonia social. Trata-se inequivocamente de uma fiel concretização do vetusto brocardo latino dormientibus non sucurrit jus.”
 
Em Direito Tributário, a decadência está disciplinada no artigo 173 e também no artigo 150, § 4º, do CTN, embora não trate de decadência, mas de lançamento por homologação. A decadência, no Direito Tributário, significa a extinção do direito de a fazenda pública efetuar o lançamento. Portanto, é a decadência que extingue o direito de constituir o crédito, mas o crédito é constituído pelo lançamento, o que nos leva à curiosa conclusão de que a decadência extingue algo, ou seja, o crédito tributário, que ela mesma impediu que chegasse a existir.
Necessário transcrever o artigo 173 do CTN:
 
“Artigo 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados:
I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;
II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.
Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.”
 
A regra geral relativa à decadência encontra-se no artigo 173, inciso I, cujo teor “o direito de constituir o crédito extingue-se em cinco anos contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que poderia ter sido efetuado o lançamento.”
Outra regra está inserida no artigo 173, inciso II, do CTN. Segundo esse dispositivo, inicia-se contagem do prazo de cinco anos a partir da data em que tenha se tornado definitiva decisão que haja anulado, por vício formal, lançamento anteriormente efetuado.
 
Conceito de Prescrição
A prescrição, a exemplo da decadência, também é forma de extinção do crédito tributário constante do inciso V do artigo 156 do CTN. A prescrição está disciplinada no artigo 174 do Código Tributário Nacional. A prescrição no direito tributário, que ocorre contra a fazenda pública, acarreta a extinção do direito que a fazenda possui de promover ação judicial para a cobrança do crédito tributário já definitivamente constituído e não pago pelo sujeito passivo. Em resumo, a prescrição extingue o direito de ação judicial de cobrança do crédito não pago e, segundo o CTN, extingue também o próprio crédito. Vale destacar o artigo 174, caput, do CTN: “Artigo 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.”
 
Importante notar que o início da contagem do prazo prescricional é sempre um momento posterior ao início da contagem do prazo decadencial e nunca há contagem simultânea de ambos. Na verdade, enquanto se está contando prazo decadencial não tem sentido falar-se em prescrição. Se ocorrer a extinção pela decadência, também não se terá chegado a cogitar de prazo prescricional. Somente haverá início de contagem para prescrição se não tiver ocorrido a decadência, e após a existência da constituição definitiva do crédito tributário.
Se o sujeito passivo, dentro do prazo decadencial, é notificado do lançamento, não se fala mais em decadência. Entretanto, pode não se iniciar nesse momento a contagem do prazo prescricional porque o sujeito passivo pode impugnar administrativamente o lançamento. Tendo havido essa impugnação, somente com a decisão administrativa final, o crédito tributário será considerado definitivamente constituído, e apenas a partir desse momento inicia-se a contagem do prazo de prescrição.
Nesse sentido, tem decidido o Egrégio Superior Tribunal de Justiça[6]:
 
“TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – EMBARGOS – ICMS – AUTO DE INFRAÇÃO – CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO – DECADÊNCIA – RECURSO ADMINISTRATIVO – ARTS 150 E 173 DO CTN. 
3. É entendimento assente nesta Corte que, uma vez constituído o crédito tributário pela notificação do auto de infração, não há falar em decadência, mas em
 prescrição, cujo termo inicial é a data da constituição definitiva do crédito. Havendo impugnação pela via administrativa, a exigibilidade do crédito tributário fica suspensa. Inicia-se para a Fazenda o curso do prazo prescricional com a notificação da decisão final do processo administrativo. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos, para negar provimento ao recurso especial, a fim de afastar a decadência e restabelecer, assim, os termos dos acórdão recorrido.
Análise e Interpretação da Decadência e Prescrição no Direito Tributário
Segundo Luciano Amaro[7], “A certeza e a segurança do direito não se compadecem com a permanência, no tempo, da possibilidade de litígios instauráveis pelo suposto titular de um direito que tardiamente venha a reclamá-lo. Dormientibus non succurrit jus. O direito positivo não socorre a quem permanece inerte, durante largo espaço de tempo, sem exercitar seus direitos. Por isso, esgotado certo prazo, assinalado em lei, prestigiam-se a certeza e a segurança, e sacrifica-se o eventual direito daquele que se manteve inativo no que respeita à atuação ou defesa desse direito.”
Diferenciando decadência nos âmbitos cível e tributário, Leandro Paulsen[8] assevera:
 
“Aliás, o instituto da decadência, em direito tributário, possui elementos que o diferenciam da decadência do direito privado: a) o termo inicial, no direito privado, coincide com o nascimento do direito subjetivo (no campo tributário isso acontece somente com os tributos sujeitos a lançamento por homologação); b) o prazo que culmina com o fato jurídico da decadência não se interrompe nem se suspende (no direito tributário há causa interruptiva – CTN, artigo 173, II).”
 
O Código Civil de 2002 cuida separadamente da prescrição e decadência, dando-lhes alguns arcabouços que permite a diferenciação, não obstante os dois institutos ainda apresentarem pontos comuns.
A prescrição extingue a pretensão do titular do direito violado. O Código Civil permite a renúncia expressa, respeitados os direitos de terceiro, sujeita a prescrição e em regra, à alegação da parte, vedada sua decretação de ofício. Regula ainda, ao devedor que efetua o pagamento, não é permitida a restituição. Previu o Código Civil, que se um direito é violado, o titular pode agir imediatamente para protegê-lo. Se sua pretensão tarda, este pode ser atingida pela prescrição, que é contada por prazos legais, vedada sua alteração pelas partes, embora possam ser renunciados expressa ou tacitamente.
Já no Direito Tributário, como se trata de relação de natureza patrimonial, o CTN poderia ter fixado prazo para que o fisco, não satisfeito o pagamento pelo contribuinte, impetrasse ação de cobrança, estabelecendo o prazo que entendesse necessário, a contar do nascimento da obrigação. Todavia, condicionado a problemática da necessidade de formalização do lançamento, fenômeno que não se faz presente aos outros ramos do direito, o CTN optou por fixar dois prazos, sendo o primeiro lapso de tempo para “constituir” ou formalizar o crédito tributário, e o segundo para, se não satisfeito o pagamento, propor ação de cobrança. O CTN chamou o primeiro prazo de “decadência” e o segundo de “prescrição”. Assim, decorrendo o prazo em que o sujeito ativo deveria efetuar o lançamento, seu direito decai pela inação, opera-se a decadência ou caducidade. Ao passo que, constituído o crédito e não adimplido pelo devedor, o sujeito ativo não ajuíza ação de cobrança, dá-se a prescrição da ação.
Em um caso prático, a autoridade administrativa poderia ter realizado o lançamento no exercício em que ocorre o fato gerador do tributo. Por exemplo, se ocorreu o fato gerador de uma taxa sujeita a lançamento de ofício em 01/07/2010, data em que se procedeu a atividade de polícia que é o fato gerador da taxa, o lançamento pode ser realizado a partir de 01/07/2010. Logo, se não foi feito o lançamento, o exercício em que ele poderia ter sido efetuado é 2011 e o prazo decadencial iniciou em 1º de janeiro de 2011, primeiro dia do exercício seguinte. O lançamento pode ser efetuado até 31/12/2015 e a decadência ocorrerá em 1º de janeiro de 2016.
A situação será diferente quando o fato gerador é considerado ocorrido no último instante do dia 31 de dezembro do ano. Imaginemos que uma lei do Município X estabeleça que o fato gerador “propriedade de imóvel urbano” considera-se ocorrido em 31 de dezembro de cada ano. Nessa mesma situação, imaginemos o ano de 2010, como exemplo. O fato gerador “propriedade de imóvel urbano em 2010” é considerado ocorrido no último instante de 31 de dezembro de 2010. Portanto, o lançamento não poderia ser efetuado em 2010, mas só em 2011. Assim, o “primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado” será 1º de janeiro de 2012. A decadência do direito de lançar o IPTU relativo a 2010 só ocorrerá em 1º de janeiro de 2017.
Outro termo de início de contagem de prazo decadencial está previsto no parágrafo único do artigo 173 do CTN. Diz esse parágrafo que o direito de lançar extingue-se definitivamente em cinco anos contados da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento. Segundo o entendimento majoritário da doutrina, esse parágrafo trata de uma possibilidade de antecipação do início da contagem do prazo decadencial. Entende-se que na hipótese de ser iniciado o lançamento, por exemplo, mediante a lavratura de um termo de início de procedimento fiscal, notificado ao sujeito passivo, ou a intimação do sujeito passivo para comparecer à repartição fazendária a fim de prestar esclarecimentos relacionados ao fato gerador de determinado tributo, antes que tenha tido início a contagem do prazo decadencial pela regra geral do inciso I do artigo 173 do CTN, antecipa-se o início da contagem da decadência para a data da notificação desse início de procedimento.
No exemplo do IPTU do Município X, caso o fisco municipal precisasse obter determinadas informações relativas ao imóvel ou a alguma condição pessoal do sujeito passivo para efetuar o lançamento, e intimasse o sujeito passivo para prestar essas informações, digamos, em 10 de maio de 2011, o início da contagem do prazo decadencial dar-se-ia em 10/05/2011, data da notificação, ao sujeito passivo, de início de procedimento fiscal necessário à realização do lançamento. Ocorreria, portanto, uma antecipação em relação à data de início que teríamos se fosse aplicado o inciso I do artigo 173 do CTN. Diferentemente, se o fisco municipal intimasse o proprietário em, digamos, 15/03/2012, a contagem do prazo de decadência já teria iniciado em 1º de janeiro de 2012 e a intimação não produziria nenhum efeito em relação à contagem do prazo de decadência.
Interessante a análise do artigo 173, inciso II, do CTN. Segundo esse dispositivo, inicia-se contagem do prazo de cinco anos a partir da data em que tenha se tornado definitiva decisão que haja anulado, por vício formal, lançamento anteriormente efetuado.
Em caso de lançamento anulado por vício de forma, por exemplo, lavrado por autoridade incompetente, há interrupção da decadência. Inicia-se o prazo de cinco anos novamente, para que o fisco constitua o crédito tributário.
O dispositivo legal foi alvo de duras críticas por renomados autores. Importante destacar a doutrina de Luciano Amaro[9], que assim se posicionou diante da regra:
“O dispositivo comete um dislate (...) a um só tempo, introduz, para o arrepio da doutrina, causa de interrupção e suspensão do prazo decadencial (suspensão, porque o prazo não flui na pendência do processo em que se discute a nulidade do lançamento, e interrupção, porque o prazo recomeça a correr do início e não da marca já atingida no momento em que ocorreu o lançamento nulo). De outro, o dispositivo é de uma irracionalidade gritante. Quando muito, o sujeito ativo poderia ter a devolução do prazo que faltava quando foi praticado o ato nulo.”
 
Segundo o direito privado, a decadência, como regra, não se suspende nem se interrompe. Entretanto, não existe nenhuma proibição, nem no Direito privado, nem no público, de que a lei preveja uma hipótese de suspensão ou interrupção de decadência.
A decadência no caso do lançamento por homologação implica pagamento pelo sujeito passivo antes de qualquer atividade ou notificação do fisco.
Feito esse pagamento, compete à autoridade administrativa homologar ou recusar a homologação. No caso de recusa da homologação, o fisco deverá lançar, de ofício, a diferença correspondente ao imposto que deixou de ser pago antecipadamente, bem como os consectários correspondentes. Esse lançamento de ofício está expressamente previsto no inciso V do artigo 149 do CTN. Como sabemos, existe a possibilidade, bastante frequente, de a fazenda não se manifestar prontamente quanto ao pagamento efetuado antecipadamente pelo sujeito passivo. Este, evidentemente, não poderia permanecer indefinidamente à mercê da potencial manifestação fisco. Por isso, o § 4º do artigo 150 do CTN estabelece que, salvo prazo diverso previsto em lei, considera-se feita a homologação e definitivamente extinto o crédito em cinco anos, contados do fato gerador. Esta extinção do crédito pela inércia da fazenda é denominada homologação tácita e sua principal consequência é impossibilitar a fazenda de rever de ofício o pagamento feito pelo sujeito passivo. Portanto, no caso de lançamento por homologação, não ocorre exatamente decadência do direito de realizar essa modalidade de lançamento. O que ocorre é a extinção definitiva do crédito pelo instituto da homologação tácita a qual tem como conseqüência indireta a extinção do direito de rever de ofício o lançamento. Em síntese, a homologação tácita acarreta a decadência do direito de a fazenda realizar o lançamento de ofício relativo à diferença de eventual imposto que tenha deixado de ser pago e aos acréscimos legais a essa diferença.
Interessante é o entendimento doutrinário sustentado por Luciano Amaro[10] de que o lançamento dito por homologação não é atingido pelo instituto da decadência:
“O lançamento por homologação não é atingido pela decadência, pois feito o lançamento (dito ‘antecipado’), ou a autoridade administrativa anui e homologa expressamente (lançamento por homologação expressa) ou deixa transcorrer, em silêncio, o prazo legal e, dessa forma, anui tacitamente (lançamento por homologação tácita). Em ambos os casos, não se pode falar em decadência (do lançamento por homologação), pois o lançamento terá sido realizado (ainda que pelo silêncio).O que é passível de decadência é o lançamento de ofício,que cabe à autoridade administrativa realizar quando constate omissão ou inexatidão do sujeito passivo no cumprimento do dever de ‘antecipar’ o pagamento do tributo.”
 
A parte final do § 4º do artigo 150 do CTN traz ressalvas à regra geral de homologação tácita nos casos em que há dolo, fraude ou simulação. Nesses casos, em vez de se aplicar o termo de início previsto no § 4º do artigo 150, ou seja, a data do fato gerador, aplicando-se a regra do artigo 173, I, do CTN, contando-se o prazo de início para a decadência do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento de ofício poderia ter sido efetuado.
Cabe ressaltar, que o artigo 45 da Lei nº 8.212/1991 estabelece que o prazo de decadência, no caso das contribuições de seguridade social, é de dez anos, conforme transcrito abaixo:
 
“Artigo 45. O direito da Seguridade Social apurar e constituir seus créditos extinguese após 10 (dez) anos contados:
I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o crédito poderia ter sido constituído;
II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, a constituição de crédito anteriormente efetuada.”
 
As contribuições da seguridade social são tributos lançados por homologação, e como foi dito, segundo o CTN, essas regras são aplicáveis aos lançamentos de ofício.
No entanto, o Tribunal regional Federal – TRF, da 4ª Região, aceitou a argumentação de inconstitucionalidade do artigo 45 da Lei 8.212/91:
 
"ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE - CAPUT DO ARTIGO 45 DA LEI 8.212/91. É inconstitucional o caput do artigo 45 da Lei 8.212/91 que prevê o prazo de 10 anos para que a Seguridade Social apure e constitua seus créditos, por invadir área reservada à lei complementar, vulnerando, desta forma, o artigo 146, III, b, da Constituição Federal." (TRF 4ª Região, Corte Especial, Argüição de Inconstitucionalidade em AI nº 2000.04.01.092228-3/PR, rel. Des. Federal Amir Sarti, DJ 05.09.2001, p. 509).”
 
Portanto, às contribuições previdenciárias se aplica a regra contida no artigo 173, inciso I, do Código Tributário Nacional, dada a sua natureza tributária. Assim, o STJ tem afastado o disposto no artigo 45 da Lei n. 8.212/1991, que estabelecia prazo decadencial de 10 anos.
A tese dos Cinco mais Cinco
O artigo 168 do CTN estabelece o prazo de cinco anos para o contribuinte pleitear a restituição. Existe uma polêmica interminável sobre a natureza desse prazo para pedir a restituição é de decadência ou de prescrição. Não há consenso sobre o assunto.
A redação do artigo 168 do CTN é a seguinte:
 
“Artigo 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:
I - nas hipóteses dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário;
II - na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.”
 
Importante destacar que o início da contagem do prazo é contado da data do pagamento indevido ou da data em que se tornou definitiva ou transitou em julgado a decisão que desfez a decisão condenatória anterior, hipótese do artigo 165, inciso III, do CTN. É pacífico que o particular não está obrigado a pleitear primeiro administrativamente para, somente depois de esgotada a esfera administrativa, recorrer à via judicial. A exigência de exaurimento da via administrativa, que parece ser o que previa o CTN, e que era aceito por antigos acórdãos do extinto Tribunal Federal de Recursos, está completamente superado, sendo incompatível com o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, relativamente ao princípio da inafastabilidade da jurisdição judicial. O pedido, portanto, pode ser feito à Administração ou ao Poder Judiciário. Pode o particular, ainda, dentro do prazo de cinco anos, mesmo tendo iniciado o pleito na esfera administrativa, abandoná-la e partir para a ação judicial de repetição do indébito.
 O STJ possui jurisprudência afirmando que, no caso dos tributos lançados por homologação, o prazo de cinco anos para pedir a restituição só se inicia depois de estar “definitivamente extinto” o crédito tributário, justamente porque o artigo 168, inciso I, do CTN estabelece que o prazo de cinco anos inicia-se a partir “da data da extinção do crédito tributário”. Ora, o artigo 150, § 4º, do CTN diz que o crédito só está definitivamente extinto com a homologação tácita, que ocorre em cinco anos, contados da ocorrência do fato gerador. Portanto, para o STJ[11], o prazo total pra pedir a restituição, no caso dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, será de dez anos: cinco anos, contados do fato gerador, para que o crédito se considere extinto, e mais cinco anos, contados da data da extinção, para ser efetuado o pedido de restituição.
 
PRAZO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. TERMO INICIALNa hipótese de lançamento tributário por homologação em que o fisco permaneceu inerte em fazê-la, o prazo de decadência somente começa a fluir após decorridos cinco anos da ocorrência do fato gerador, acrescidos de mais cinco anos a partir da homologação tácita do lançamento. Assim, não há que se falar emprazo prescricional a contar da declaração de inconstitucionalidade pelo STF ou da Resolução doSenado Federal. REsp 610.560-PI , Rel. Min. José Delgado, julgado em 23/3/2004.
 
TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ART. 45 DA LEI Nº 8.212/91. ENFOQUE CONSTITUCIONAL. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. DECADÊNCIA. TERMO INICIAL. ART. 150, § 4º E 173, I, AMBOS DO CTN. TAXA SELIC. OFENSA A ARTIGOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INVIABILIDADE DE ANÁLISE NO ÂMBITO DO RECURSO ESPECIAL.
1. Tribunal a quo, ao analisar a possibilidade de aplicação do art. 45 da Lei nº 8.212/91 ao caso, decidiu a questão sob o enfoque eminentemente constitucional, de competência do STF e, portanto, fora do âmbito de apreciação do recurso especial.
2. Se não houve pagamento antecipado pelo contribuinte, não há o que homologar nem se pode falar em lançamento por homologação. Surge a figura do lançamento direto substitutivo, previsto no art. 149, V do CTN, cujo prazo decadencial rege-se pela regra geral do art. 173, I do CTN.
3. Com o encerramento do prazo para homologação (art. 150, § 4º do CTN), inicia-se a contagem do prazo previsto no art. 173, I do CTN. Inexistindo pagamento antecipado, conclui-se ter o Fisco o prazo de 10 anos, após a ocorrência do fato gerador, para constituir o crédito tributário. Processo REsp 575154 / SC RECURSO ESPECIAL
2003/0141844-8. Ministro CASTRO MEIRA (1125). DJ 03/10/2005 p. 173.
 
Hugo de Brito Machado[12], portanto, refuta o entendimento de que os tributos sujeitos a lançamento por homologação teriam o prazo decadencial iniciado com o término do prazo para a homologação, isto é, cinco anos após a ocorrência do fato gerador em concreto, obtemperando no sentido de que tal prazo tem início quando da ocorrência do fato gerador em concreto.
Ainda após a edição da Lei Complementar nº 118, de 09 de fevereiro de 2005, que alterou a Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional, e dispõem sobre a interpretação do inciso I do art. 168 da mesma Lei, o STJ continuou admitindo o tese dos cinco mais cinco, aplicando retroativamente e considerando a data da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, e mediante aplicação da regra interpretativa, conforme artigo 106, inciso I, do CTN. Importante destacar o artigo 3º da Lei Complementar nº 118/2005[13]:
 
“Art. 3º Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1o do art. 150 da referida Lei.
Art. 4º Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3o, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional.”
 
Vejamos a jurisprudência do STJ ao analisar controvérsia do início do prazo prescricional para repetição do indébito:
 
RECURSO REPETITIVO. PRAZO PRESCRICIONAL. LC N. 118/2005. No recurso representativo de controvérsia(art. 543-C do CPC e Res. n. 8/2008-STJ), a Seção reiterou que, pelo princípio da irretroatividade, impõe-se a aplicação da LC n. 118/2005 aos pagamentos indevidos realizados após sua vigência e não às ações propostas posteriormente ao referido diploma legal, visto ser norma referente à extinção da obrigação e não ao aspecto processual da ação correspectiva. Assim, tratando-se de pagamentos indevidos antes da entrada em vigor da LC n. 118/2005 (9/6/2005), o prazo prescricional para o contribuinte pleitear a restituição do indébito, nos casos dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, continua observando a tese dos “cinco mais cinco”, desde que, na data da vigência da novel lei complementar, sobejem, no máximo, cinco anos da contagem do lapso temporal, regra que se coaduna com o disposto no art. 2.028 do CC/2002. Desta sorte, ocorrido o pagamento antecipado do tributo após a vigência da aludida norma jurídica, o dies a quo do prazo prescricional para a repetição/compensação é a data do recolhimento indevido. No caso, insurge-se o recorrente contra a prescrição quinquenal determinada pelo Tribunal a quo,pleiteando a reforma da decisão para que seja determinada a prescrição decenal, sendo certo que não houve menção, nas instâncias ordinárias, acerca da data em que se efetivaram os recolhimentos indevidos, mercê de a propositura da ação ter ocorrido em 27/11/2002, razão pela qual se conclui que os recolhimentos indevidos ocorreram antes do advento da LC n. 118/2005. Daí a tese aplicável ser a que considera os cinco anos de decadência da homologação para a constituição do crédito tributário acrescidos de mais cinco anos referentes à prescrição da ação. Outrossim, destaque-se que, conquanto as instâncias ordinárias não mencionem expressamente as datas em que ocorreram os pagamentos indevidos, é certo que foram efetuados sob a égide da LC n. 70/1991, uma vez que a Lei n. 9.430/1996, vigente a partir de 31/3/1997, revogou a isenção concedida pelo art. 6º, II, da referida lei complementar às sociedades civis de prestação de serviços, tornando legítimo o pagamento da Cofins. Precedente citado: AgRg nos ERESP 644.736-PE, DJ 27/8/2007. REsp 1.002.932-SP, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 25/11/2009.
 
O artigo 169 do CTN contém uma regra extremamente específica.  Estabelece um prazo de prescrição para ajuizamento de ação anulatória de uma decisão administrativa que tenha negado arestituição. Quanto à natureza deste prazo não há qualquer polêmica. É a seguinte a sua redação:
 
“Artigo 169. Prescreve em dois anos a ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição.
Parágrafo único. O prazo de prescrição é interrompido pelo início da ação judicial, recomeçando o seu curso, por metade, a partir da data da intimação validamente feita ao representante judicial da Fazenda Pública interessada.”
 
Imaginemos que o particular protocolizou, perante a Administração, pedido de restituição de um valor por ele pago a título de tributo e que ele, por qualquer motivo, entende não ser devido. A decisão no processo administrativo de repetição do indébito é indeferida. O sujeito passivo, caso não deseje ajuizar diretamente uma ação de repetição de indébito teria a opção de intentar uma ação visando a anulação da decisão administrativa que indeferiu seu pedido de restituição. O prazo para ajuizar essa ação anulatória específica é de dois anos; trata-se de prazo de prescrição. O parágrafo único do artigo 169 do CTN estabelece que o início da ação judicial interrompe a prescrição. É um caso especial de interrupção, porque, em vez de o prazo recomeçar do zero, reinicia-se da metade, a partir da citação da Fazenda.
O fim da tese dos Cinco mais Cinco
Em outubro de 2006, analisando em recurso de Embargos de Divergência, processo de Embargos à Execução Fiscal Processo EREsp 413265/SC[14], a Ministra do Superior Tribunal de Justiça, extinguiu o processo de execução, não mais reconhecendo a tese dos cinco mais cinco, assim se manifestando:
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO. DECADÊNCIA. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO DECLARADO E NÃO-PAGO. CORRETA APLICAÇÃO DO ART. 173, I, DO CTN. PRECEDENTES. RECURSO DESPROVIDO.
1. Esta Corte tem-se pronunciado no sentido de que o prazo decadencial para constituição do crédito tributário pode ser estabelecido da seguinte maneira: (a) em regra, segue-se o disposto

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...